domingo, 20 de dezembro de 2009

A Tal Criança


Esta postagem não é religiosa!
O texto está aqui apenas por uma convicção social.
Gostei da metáfora.

Nesta época de felicidade obrigatória e consumismo compulsório, desejo, ao menos, que todas e todos tenham uma refeição decente, alguém para abraçar e um bom motivo pra despertar na manhã seguinte!


Entre o Menino Jesus e o Papai Noel

(Antonio Cechin e Jacques Távora Alfonsin)


Em que lugar, hoje, Maria e José obteriam acolhida para o parto iminente do filho esperado? Se estivesse nascendo agora, com qual criança mais se assemelharia o Menino Jesus? Às vésperas do seu aniversário, parece de todo oportuno procurar-se responder tais perguntas, já que o natal é a celebração de um nascimento que mudou a história da humanidade toda.


Pela sua conhecida pobreza, a mãe o pai procurariam, quem sabe, a emergência de algum hospital que atenda pelo SUS. Ansiosos, são recebidos no balcão de informações, em meio a um grupo grande de gente doente e triste, cabeça baixa, esperando chamada, com uma senha na mão.


Começa, mais de dois mil anos depois, a histórica desculpa: “Não. Lamentamos. Vocês terão de procurar outro hospital. Vejam que até os nossos corredores estão lotados. Não temos um leito, sequer, disponível, nem médicos e enfermeiras suficientes para tanta gente.”


Sem o dinheiro que, como se sabe, dificilmente deixa de abrir qualquer porta, batem na sacristia de uma Igreja. “Não. Aqui não se pode hospedar ninguém. A gente batiza, reza missa todos os domingos, faz a catequese da primeira eucaristia, celebra casamentos, exéquias de pessoas falecidas. Uma vez por mês reunimos a comunidade num almoço. É verdade que temos hospitais, também, mas eles são obrigados a cobrar internações porque os subsídios públicos nunca chegam em dia e os atrasos estão levando todos eles à falência.”


A preocupação e a angústia crescendo, José meio desesperado, Maria sentindo as primeiras contrações, resolvem tomar o rumo da periferia urbana para, quem sabe, em algum galpão abandonado, a mulher consiga parir, quando menos, abrigada.


Lua que se acende e apaga no andar das nuvens, por ela conseguem entrever algumas luzes, ouvir algumas vozes numa corrente de barracas de lona preta estendida na beira da estrada. Denunciados pelo latido dos cachorros, chegam muito envergonhados numa delas. Um casal tão pobre como os recém chegados, levanta o candieiro para identificá-los e pede para eles entrarem imediatamente, pois já adivinhou que a urgência não admite outro gesto.


Maria, já sem tempo, consegue se deitar num acolchoado velho que, no chão da barraca, serve de cama para o casal. Três crianças, duas meninas e um menino, dormem profundamente, recolhidas num canto mais abrigado. Os visitantes mal conseguem se apresentar. “Eu sou Laurindo. Prazer.” “Eu sou Joana, prazer”. Juntamente com José, passam a se movimentar ligeiro, como se tivessem ensaiado, pois a coisa toda não pode acabar mal. Os homens reavivam brazas que já estavam agonizando num fogo de chão, achegam gravetos que sobraram do uso anterior que cozinhou só feijão, por sinal queimado, pelo cheiro que ainda se sente. A fumaça toma conta do ambiente e faz arder os olhos de quem espera, agora, numa ansiedade do tipo que afoga. A mulher conseguiu ferver água e escaldar uma faca de cozinha, à vista de Maria, mal coberta por um lençol surpreendentemente limpo que uma vizinha, avisada do caso, lhe alcançou.


O homenzinho se livrou do ventre materno, separado pela faca de Dona Joana, a um choro alto e forte, de quem sorve o primeiro ar e reclama a primeira mamada.


Uma alegria aliviada se desata. Serena, se apossa de todos.. Os ocupantes das outras barracas, tudo gente sem-terra e sem-teto, que também ainda não encontrou lugar para ficar, como o pai e a mãe do recém nascido, acorrem pressurosos em ajudar. Laurindo e Joana honrados, Maria e José confortados, há um que de solidariedade amorosa, feita de palavras e gestos, todo o mundo querendo repartir o pouco que tem com o casal de viajantes que festeja a chegada do primeiro filho.


No outro lado da cidade, muito longe dali, um foguetório faz-se ouvir, a noite se enche de sons, risos, as ruas, as árvores e os edifícios cobertos por milhares de pequenas lâmpadas coloridas, piscando, são cercados por gente que troca presentes, se abraça, anda atrás de um papai noel arquejante, vermelho na roupa e no rosto, o cabelo e a barba branca artificiais mal dependurados num gorro já meio caído, pelo peso de um saco que ele balança nas costas, cansado de representar, apenas, um papel.


Comparadas essas pessoas, comparados esses lugares, será aqui, ou lá, que o Menino Jesus nasceria hoje? Entre a pobreza e a escassez de lá, ou a fartura e até o desperdício daqui? Por tudo o que a criança viveu e ensinou depois, soube-se que ela acabou sendo perseguida, tanto pelo poder político, como pelo econômico e, até, o religioso. Acabou morrendo numa cruz, resultado de um julgamento no qual nem o direito de defesa lhe foi garantido.


A semelhança do seu nascimento e da sua vida com o nascimento numa barraca e a luta que empreendeu depois em favor das/os pobres, não nos deixa duvidar de que, hoje como ontem, são milhares as crianças que nascem nas condições miseráveis nas quais nasceu o Menino Jesus, e são muitas/os as/os adultas/os sem-terra e sem-teto que morrem por defender a mesma Justiça que Ele defendeu.


Entre a devoção que se presta ao Papai Noel e o Menino Jesus, então, há uma distância que beira ao escárnio. Substituir esse por aquele, no natal, é como dar-se preferência às coisas, às mercadorias, aos símbolos do consumo, do que às pessoas, aquelas que conosco vivem, especialmente as que, como a Tal Criança, é necessitada e pobre.


Há um tal poder de repressão a esse povo pobre, do qual Ela fazia parte, que até as farmácias caseiras e as escolas itinerantes que, por força de sua própria condição humana, ele é forçado a criar, em defesa de sua dignidade, são destruídas pela perseguição que contra ele movem forças públicas e privadas. Não raro, como aconteceu recentemente aqui no Rio Grande do Sul, algum/a dos/das seus/suas integrantes derrama o seu sangue sobre a terra que lhe é negada, como negada foi a hospedagem “normal” para José e Maria.


Como Jesus Cristo, esse também é um povo crucificado. Em vez de andar atrás de um velho ridículo, então, o natal nos convida mesmo é a descer esse povo da cruz, incorporar o seu sofrimento, servindo-o ao ponto de enxugar-lhe os pés, assim seguindo o exemplo de Quem nasceu, viveu, amou e morreu por ele.


Fonte da imagem: http://media.photobucket.com/image/beb%25C3%25AA%252Bpobre/psytasya/ma2.jpg

.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

O Beijo e a Aids

.
Neste "Primeiro de Dezembro", Dia Mundial de Luta Cotra a Aids, o tema foi "Viver com aids é possível. Com o preconceito não".

Porém o preconceito continua tão grande que foi preciso essa nota:

NOTA DE ESCLARECIMENTO

1. As reações contrárias ao beijo da campanha do Dia Mundial de Luta
contra a Aids 2009, mesmo que isoladas, indicam que ainda há um grande
caminho para se percorrer sobre o tema do preconceito e da
discriminação contra as pessoas soropositivas. Informações incorretas
como a de que o beijo transmite o HIV só colaboram para aumentar o
estigma que cerca a doença e para negar a essas pessoas o convívio
social pleno.

2. Ao contrário do que alguns veículos de comunicação noticiaram desde
o lançamento da campanha, beijo na boca não transmite o vírus da aids.
Líquidos corporais, tais como suor, lágrima e saliva concentram apenas
anticorpos contra o HIV e partículas virais não infectantes (fragmentos
de proteínas virais).

3. As formas de transmissão do HIV, cientificamente comprovadas até o
momento, são por meio do contato direto com fluidos genitais masculinos
e femininos (sexo vaginal, anal ou oral desprotegidos), pelo sangue
(transfusão de sangue não testado e pelo compartilhamento de seringas e
agulhas contaminadas) e pelo aleitamento materno quando a mãe vive com
o HIV.

5. Não existe nenhum caso descrito na literatura científica em todo o
mundo que comprovadamente tenha demonstrado que o beijo transmitiu o
HIV.

6. Nesse sentido, as campanhas e ações de prevenção da transmissão do
vírus devem ser direcionadas para as reais exposições de risco.
Qualquer mensagem que reforce o preconceito contra soropositivos deve
ser desmistificada.

7. Foi com base nessas evidências científicas que o Ministério da Saúde
optou por usar o beijo como símbolo da aceitação, do acolhimento e da
proximidade, perfeitamente possíveis entre casais sorodiscordantes -
quando só um dos parceiros é soropositivo.

Mariângela Simão
Diretora do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais
Ministério da Saúde

Para conhecer e fazer download do material da campanha, clique AQUI!

Abaixo, um dos vídeos.

.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Igbá-Iwà: O Feminino na Criação do Universo


No dia 20 de junho de 2008, Kiusam de Oliveira, pesquisadora, coreografa e bailarina, enviou um email intitulado “Convite para Audição”, buscando voluntárias e voluntários para um curso de dança-afro.

Ali começava a jornada rumo ao espetáculo de dança "O Feminino na Criação do Universo", que estreou dia 28 de novembro de 2009, em Diadema, com o Teatro Clara Nunes lotado!

O mais interessante é que esse não é um grupo de dança “convencional”. É um grupo formado por mulheres e homens da comunidade, que não só se aproximaram da arte da dança, mas também das reflexões sobre gênero e raça na sociedade contemporânea brasileira. Sobretudo o viver, habitar, se relacionar o/com o “corpo da mulher negra”.

Os atos do espetáculo nos contam sobre a criação do universo segundo a Tradição Africana Iorubá. A música, executada ao vivo, é tão vibrante quanto as cores do figurino e o ritmo dos passos.

Após o espetáculo não resisti e fiquei na fila da tietagem, pra dar um abraço em Kiusam. Inclusive comentei que, recém chegada de Moçambique, reconheci na coreografia alguns dos passos de danças que observei por lá. “_Muita pesquisa!", respondeu ela, com seu generoso sorriso.

Fica a dica! Quem não teve a oportunidade de estar em Diadema, o grupo fará nova apresentação em São Bernardo do Campo-SP.

Igbá-Iwà: O Feminino na Criação do Universo
Data: 11 de dezembro de 2009 (sexta-feira)
Horário: 20 horas
Local: Sindicato dos Metalúrgicos de SBC
(Rua João Basso, 231. Centro-Ferrazópolis/SBC)
ENTRADA FRANCA
Mapa do local: clique aqui.

Ficha técnica:
Coreografia e Direção: Kiusam de Oliveira
Cenário: Rose Vilhen
Figurino: Hamilton de Paula
Fotografias desta postagem: Ligia Oki
.


.