Encontrando Bianca
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Um pouco do que vejo, ouço, leio, sinto e meus devaneios acerca disto tudo...
Nada aqui pretende ser "verdade". Devaneios são devaneios. SEJA BEM-VINDX
V O T O
O Senhor Ministro Ayres Britto (Relator):
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Com o que este Plenário terá bem mais abrangentes possibilidades de, pela primeira vez no curso de sua longa história, apreciar o mérito dessa tão recorrente quanto intrinsecamente relevante controvérsia em torno da união estável entre pessoas do mesmo sexo, com todos os seus consectários jurídicos. Em suma, estamos a lidar com um tipo de dissenso judicial que reflete o fato histórico de que nada incomoda mais as pessoas do que a preferência sexual alheia, quando tal preferência já não corresponde ao padrão social da heterossexualidade. É a perene postura de reação conservadora aos que, nos insondáveis domínios do afeto, soltam por inteiro as amarras desse navio chamado coração.
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É como dizer: se o corpo se divide em partes, tanto quanto a alma se divide em princípios, o Direito só tem uma coisa a fazer: tutelar a voluntária mescla de tais partes e princípios numa amorosa unidade. Que termina sendo a própria simbiose do corpo e da alma de pessoas que apenas desejam conciliar pelo modo mais solto e orgânico possível sua dualidade personativa em um sólido conjunto, experimentando aquela nirvânica aritmética amorosa que Jean-Paul Sartre sintetizou na fórmula de que: na matemática do amor, um mais um... é igual a um;
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A Constituição Federal não faz a menor diferenciação entre a família formalmente constituída e aquela existente ao rés dos fatos. Como também não distingue entre a família que se forma por sujeitos heteroafetivos e a que se constitui por pessoas de inclinação homoafetiva. Por isso que, sem nenhuma ginástica mental ou alquimia interpretativa, dá para compreender que a nossa Magna Carta não emprestou ao substantivo “família” nenhum significado ortodoxo ou da própria técnica jurídica.
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Assim interpretando por forma não reducionista o conceito de família, penso que este STF fará o que lhe compete: manter a Constituição na posse do seu fundamental atributo da coerência, pois o conceito contrário implicaria forçar o nosso Magno Texto a incorrer, ele mesmo, em discurso indisfarçavelmente preconceituoso ou homofóbico. Quando o certo − data vênia de opinião divergente - é extrair do sistema de comandos da Constituição os encadeados juízos que precedentemente verbalizamos, agora arrematados com a proposição de que a isonomia entre casais heteroafetivos e pares homoafetivos somente ganha plenitude de sentido se desembocar no igual direito subjetivo à formação de uma autonomizada família. Entendida esta, no âmbito das duas tipologias de sujeitos jurídicos, como um núcleo doméstico independente de qualquer outro e constituído, em regra, com as mesmas notas factuais da visibilidade, continuidade e durabilidade. Pena de se consagrar uma liberdade homoafetiva pela metade ou condenada a encontros tão ocasionais quanto clandestinos ou subterrâneos. Uma canhestra liberdade “mais ou menos”, para lembrar um poema alegadamente psicografado pelo tão prestigiado médium brasileiro Chico Xavier, hoje falecido, que, iniciando pelos versos de que “A gente pode morar numa casa mais ou menos,/Numa rua mais ou menos,/ Numa cidade mais ou menos”/ E até ter um governo mais ou menos”, assim conclui a sua lúcida mensagem: “O que a gente não pode mesmo,/ Nunca, de jeito nenhum,/ É amar mais ou menos,/ É sonhar mais ou menos,/ É ser amigo mais ou menos,/ (...) Senão a gente corre o risco de se tornar uma pessoa mais ou menos”.
Passemos, então, a partir desse contexto normativo da família como base da sociedade e entidade credora da especial tutela do Estado.
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Logo, que não se faça uso da letra da Constituição para matar o seu espírito, (...) Ou como diz Sérgio da Silva Mendes, que não se separe por um parágrafo (esse de nº 3) o que a vida uniu pelo afeto. Numa nova metáfora, não se pode fazer rolar a cabeça do artigo 226 no patíbulo do seu parágrafo terceiro; II.3. que a terminologia “entidade familiar” não significa algo diferente de “família”, pois não há hierarquia ou diferença de qualidade jurídica entre as duas formas de constituição de um novo núcleo doméstico. Estou a dizer: a expressão “entidade familiar” não foi usada para designar um tipo inferior de unidade doméstica, porque apenas a meio caminho da família que se forma pelo casamento civil. Não foi e não é isso, pois inexiste essa figura da sub-família, família de segunda classe ou família “mais ou menos” (relembrando o poema de Chico Xavier). O fraseado apenas foi usado como sinônimo perfeito de família, que é um organismo, um aparelho, uma entidade, embora sem personalidade jurídica. Logo, diferentemente do casamento ou da própria união estável, a família não se define como simples instituto ou figura de direito em sentido meramente objetivo. Essas duas objetivas figuras de direito que são o casamento civil e a união estável é que se distinguem mutuamente, mas o resultado a que chegam é idêntico: uma nova família, ou, se se prefere, Uma nova “entidade familiar”, seja a constituída por pares homoafetivos, seja a formada por casais heteroafetivos.
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E nunca apareceu ninguém, nem certamente vai aparecer, para sustentar a tese de que “entidade autárquica” não é “autarquia”, nem “entidade federativa” é algo diferente de “Federação”. Por que entidade familiar não é família? E família por inteiro (não pela metade)?
Que as diferenças nodulares entre “união estável” e “casamento civil” já são antecipadas pela própria Constituição, como, por ilustração, a submissão da união estável à prova dessa estabilidade (que só pode ser um requisito de natureza temporal), exigência que não é feita para o casamento. Ou quando a Constituição cuida da forma de dissolução do casamento civil (divórcio), deixando de fazê-lo quanto à união estável (§6º do art. 226). Mas tanto numa quanto noutra modalidade de legítima constituição da família, nenhuma referência é feita à interdição, ou à possibilidade,de protagonização por pessoas do mesmo sexo. Desde que preenchidas, também por evidente, as condições legalmente impostas aos casais heteroafetivos. Inteligência que se robustece com a proposição de que não se proíbe nada a ninguém senão em face de um direito ou de proteção de um interesse de outrem.
E já vimos que a contraparte específica ou o focado contraponto jurídico dos sujeitos homoafetivos só podem ser os indivíduos heteroafetivos, e o fato é que a tais indivíduos não assiste o direito à não-equiparação jurídica com os primeiros. Visto que sua heteroafetividade em si não os torna superiores em nada. Não os beneficia com a titularidade exclusiva do direito à constituição de uma família. Aqui, o reino é da igualdade pura e simples, pois não se pode alegar que os heteroafetivos perdem se os homoafetivos ganham. E quanto à sociedade como um todo, sua estruturação é de se dar, já o dissemos, com fincas na fraternidade, no pluralismo e na proibição do preconceito, conforme os expressos dizeres do preâmbulo da nossa Constituição.
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No mérito, julgo procedentes as duas ações em causa. Pelo que dou ao art. 1.723 do Código Civil interpretação conforme à Constituição para dele excluir qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como “entidade familiar”, entendida esta como sinônimo perfeito de “família”. Reconhecimento que é de ser feito segundo as mesmas regras e com as mesmas conseqüências da união estável heteroafetiva. É como voto.
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DESABAFO (Vinícius Samuel)
Neste ultimo sábado, dia 22 de abril – véspera de páscoa – fui para Ubatuba com meus amigos, mais precisamente para a praia da Itamambuca. Esta viajem, ao meu ver, foi no mínimo inusitada, para não dizer enriquecedora.
Ao chegarmos na praia, estendemos quatro cangas no chão, acomodamos nossos pertences e quando estávamos acomodados fui olhar uma barraquinha de praia que tinhas algumas coisas as quais me atraíram.
Ao retornar para o local onde estávamos acomodados, vi meu amigo Amauri se levantando da areia e um senhor berrando com os meus amigos. Sem entender, cheguei impondo limites e perguntando o que estava acontecendo ali. O senhor que ali estava – alterado – me respondeu aos berros que meus amigos estavam passando protetor solar, e que isso era coisa de “boiola”, “Bicha”.
Para evitar maiores absurdos, pedi para o senhor para que se acalmasse, disse que não precisaria se exaltar, quando então ele pegou um remo que estava próximo e ameaçou agredir a todos. Absurdado com o que estava presenciando disse a ele que estava chamando a polícia, e que não teria motivo algum para cometer tal barbárie.
Então, após ter ligado para a policia, fiquei no local esperando o policial chegar. Neste meio tempo o senhor exaltado ofendia a nós todos, dizia absurdos e nos jogava latas amassadas de cerveja. Em um certo momento tive receio de ficar esperando ali, ele veio e chutou nossa garrafa de água mineral!
Com uma hora de espera o Apoio da Praia – que faz a segurança do residencial Itamambuca – chegou, me apresentei ao Apoio e disse o que estava acontecendo. O Apoio chamou o senhor de canto, conversou com ele, disse que todos ali tinham o mesmo direto, e que ninguém iria agredir ninguém, porém, eles não poderiam ficar ali para resguardar a segurança de ninguém, teriam de partir para continuar a ronda na praia. Nem bem ficaram quinze minutos, e já partiram.
Ao se ver novamente sem uma censura de seu comportamento agressivo, o senhor exaltado retornou ao seu comportamento ofensivo, que nestas alturas já incomodava não apenas a nós, mas quem ali estava com seus familiares e amigos.
Cansados com que estava acontecendo, e já desesperançosos com a vinda de alguma polícia, após UMA HORA E MEIA de espera por uma polícia que não chegava, resolvemos sair de onde estávamos para não acabarmos sendo agredidos pelo senhor exaltado. Tão logo retiramos a primeira canga do chão, eis que como num passe de mágica uma intervenção quase que divina vem ao nosso socorro, a população da praia, já cansada de todo stress gerado pelo papelão que o senhor causara se manifestou nos dizendo que dali nós não sairíamos. Neste momento senti em meu coração um alivio imenso, como se uma grande pressão que atormentava sumisse. Me senti aceito do jeito que sou por pessoas que nem conhecia, não sabia quem eram.
Nesta massa estavam famílias inteiras, pessoas que se uniram frente a uma injustiça que estava sendo acometida naquele momento e naquele lugar. Pessoas que eu mesmo jamais imaginaria que tomariam a posição que tomaram, até mesmo os surfistas se aglomeraram a massa que se formou para conter o senhor exaltado que queria nos agredir, e há horas nos ofendia com palavras de baixo calão. Neste momento confesso, o sentimento de acolhimento foi intenso, alguns amigos chegaram a chorar de emoção, e eu fui tomado por um sentimento bom.
Como me disse um amigo neste dia: “Em fim acredito que a humanidade tem jeito.”
São as pequenas atitudes que fazem as grandes diferenças.
Com mais de duas horas de atraso a polícia chegou, neste momento já bem mais aliviado relatei ao policia o que havia acontecido ali, o mesmo rio e me disse que não teria nada a fazer então, já que o senhor já não estava mais lá.
Nunca na minha vida tinha passado por este tipo de constrangimento, principalmente pelo meu jeito de ser, muito menos por um pouco de protetor solar, mas hoje sei que estou no caminho certo e amo cada vez mais a minha profissão e meu papel enquanto psicólogo.
Meus amigos e eu somos homossexuais sim, e isso não dá a ninguém o direito de nos desrespeitar de forma alguma.
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Fonte da imagens: enviadas pelo próprio Vinícius