quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

A comida da vovó (Gula) 2



Texto originalmente publicado em dezembro de 2009.

No interior do Paraná, em uma cidade que já não conheço ninguém e com o pé quebrado, um dos poucos prazeres que me restam é a gula...
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Posto de lado as consequencias, entrego-me ao meu segundo pecado capital preferido, fazendo desse período algo menos chato. E com a ajuda dos mimos familiares as coisas ficam bem mais fáceis. Ao menos quase sempre...
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Vamos ao causo:
Minha avó, 87 anos, veio me fazer a visitinha diária. Chegou toda faceira e contou:
“_Ah, Já, sabe o que fiz hoje pra janta? Banana verde!”
“_ Ai, que delícia! Trouxe um pouco pra mim, vó?”
“_Não, fia. Nem sabia que você gostava... Onde você comeu?”
“_Vó, claro que gosto! A senhora mesmo fez várias vezes... Até esses dias lá em Moçambique eu comentei que tava com vontade de comer!”
“_É? Hum... Achei que não fazia desde os tempos da Baixada da Areia...” - (Ou seja, há uns 20 anos atrás, no sítio onde ela morava e onde passei parte da infância)
“_ Ai, vó, claro que não!”
“_ Aaaah, fia, que pena que eu não trouxe. E e vô não pode trazer porque já tá descansando... Hoje levantou cedo pra carpir umas datas!”
“_Mas nem é pro vô trazer, tadinho! Amanhâ peço pro meu irmão ir buscar pro almoço!”
A vó vai embora.
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Cinco minutos depois chega o vô ,79 anos, trazendo a comida, dizendo que bom é comer no dia que fez! Todo bonitinho e feliz com o mimo que faz, deixa a comida na cozinha e diz que não vai ficar mais porque ta cansado!
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Passada uma hora, a fome chegou! Fui manquitolando até a cozinha procurar o meu jantar de comidinha-roceira-especial! Vi uma vasilha por cima do fogão, olhei: uma coisa gosmenta, não era aquilo! Nas panelas: arroz, feijão... Olhei no micro ondas: vazio! Talvez na geladeira: nem por isso!! Na falta de imaginação de onde mais procurar (na casa dos outros, só olhamos em lugares mais óbvios) perguntei:
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“_ Mãe, você viu onde o vô deixou meu abafadinho de mamão?”
“_ Mamão? Não é mamão, é banana!”
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Aaiiii... Péssima noticia! Na hora do anuncio da comida pela avó, meu desejo trocou as frutas...
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Constatei que a coisa gosmenta era o meu quitute: feito pela avó velhinha, trazido pelo avô cansado, que a neta teimou que gostava!
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O que mais eu poderia fazer além de enfrentar honradamente a situação? Esquentei a gogoroba, coloquei três colheres bem cheias no prato vazio (pra não estragar nada que entrasse em contato com ela), peguei uma fatia de pão e botei pra dentro. Tu-di-nho.
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Minha mãe, sentada na minha frente não acreditava no que via. Eu, bravamente comendo aquilo, como se estivesse em um treinamento pra combate ou numa prova de sobrevivência!
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Noutro dia a avó:
“_ Já, matou a vontade de comer a banana verde?”
“_ Ah sim, tava ótimo. Mas prefiro mesmo mamão!”
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Na boa, comer a sopa de banana era o que eu mandaria qualquer criança fazer, se ela estivesse em meu lugar.
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1) Refogado de mamão verde. Fonte da foto e receita, clique aqui.
2) Sopa de banana verde bacanuda. Fonte da foto e receita, clique aqui.
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Um comentário:

Isadora disse...

pô, achei legal a banana! se estivesse aí, comeria! a propósito, fico feliz de ver que o blog não virou só um diário de viagem (o que já era demais!), mas que você continua escrevendo suas histórias deliciosas. e ando te vendo por aí nos comentários dos amigos blogayros!
beijão!