domingo, 9 de agosto de 2009

Notícias Africanas 07


“_Giro, Mamá?” é assim que os rapazes que vendem créditos para o celular pré-pago abordam as mulheres na rua. Giro aqui é sinônimo de “bom”, “legal”, mas também significa a recarga para celular.

Por que penso que o sistema de telefonia de Moçambique é fantástico? Porque é extremamente acessível, o que faz com que praticamente todos os jovens e adultos, com alguma renda, tenham um celular. Não, isso não é exagero!

O custo do aparelho mais simples, em uma das lojas oficiais das operadoras, é aproximadamente 900 meticias. Isso quer dizer 31 dólares ou 62 reais, por um aparelho com nota fiscal, garantia e tudo mais. Quer um aparelho com menor preço? Ainda pode recorrer à “economia informal” e sem a preocupação se o “chip” vai funcionar ou não, pois aqui não se vende aparelho “bloqueado”.

Claro que o que mais onera não é exatamente o custo inicial, mas sim a manutenção da linha. Pois bem, o custo da recarga mínima é de 20 meticias (0,70 dólares ou 1,40 reais). Imbatível! Recarregando uma vez ao mês tem-se 10 sms e a garantia que a linha não será cortada. Também, caso perca o número, um novo chip custa 100 meticias (3,45 dólares ou 6,90 reais), com alguns minutos de conversa.

Outra coisa sensacional é a possibilidade de falar com todo o país como se estivesse em uma ligação local. Não existe nenhuma diferença nas tarifas quando se faz uma ligação para outra cidade ou província. Pode-se falar “do Rovuma ao Maputo"(1) a preço de ligação local.

Os rapazes que vendem os giros e chips formam um verdadeiro exército nas ruas da cidade. Nas principais avenidas ficam em dois ou três em cada esquina. Vestem um colete que os identifica e que também serve para guardar os produtos. Assim, ainda ficam com as mãos livres para vender outras coisas, como frutas e “muamba” em geral. Quer um “chinelo havaiana com bandeirinha de Moçambique(!!!)" ? Eles vendem! Isso que é demonstração de economia global: marca brasileira, produção asiática e venda moçambicana (risos)! Voltando ao tema, só rapazes trabalham na venda de giros, ao menos não me lembro de moças(2) nesta função.

A telefonia fixa em Moçambique controlada por uma empresa estatal TDM, e tem um número de usuários pequeno quando comparado aos da telefonia móvel. Neste último setor, duas empresas disputam o mercado: Mcel (1997) e Vodacom (2003). Mcel é moçambicana e detém 60% do mercado. A Vodacom é uma operadora sulafricana que entrou posteriormente no país com o objetivo de modernizar o sistema. Já em julho de 2009 o governo anunciou que uma terceira companhia entrará no mercado. O que justifica é que o setor superou todas as expectativas de crescimento (3) desde que foi implantado.

Seja como for, as duas operadoras existentes fazem uma guerra na propaganda. A Mcel financia a publicação de livros de escritores Moçambicanos, enquanto a Vodacom patrocina alguns cantores e concursos de dança nacionais. Também é comum reconhecer suas marcas em muitos, e muitos, lugares da cidade, pois pintam taxis, bancas de frutas e muros com suas cores e logos. Quanto às cores são bastante chamativas. Mcel amarelo, Vodacom azul. Inclusive, já se estuda um sistema para melhorar as multas por propaganda excessiva, pois não é raro ter muros ou imóveis inteiros com centenas de metros quadrados de pura propaganda, o que gera muita poluição visual.

O uso do celular é tão importante por aqui que algumas pessoas estão desenvolvendo programas de celular específicos na área de saúde. Um dos desenvolvedores destes programas explica que mesmo o nível de instrução ainda seja baixo entre muitos trabalhadores de saúde, o celular e o manejo deste é um fato entre todos. Um desses programinhas, por exemplo, permitiria alimentar formulas com dados simples e saber qual a dosagem exata de medicação para uma criança de tal peso! E isso absolutamente não é inútil dada à quantidade de crianças neste país. Assim, nenhuma forma de garantir qualidade e poupar um pouco de tempo, por mínimo que seja, no atendimento a elas é bobagem!

No mais, enquanto escrevia esse texto o som ambiente era de uma roda de capoeira. Fomos procurar e realmente havia uma roda de jogo na orla da praia, pertinho de casa. O bacana é que os jogadores eram moçambicanos, a capoeira de angola e os pandeiros com a bandeira do Brasil. Pra encerrar o jogo, os berimbaus, pandeiros e palmas saíram da capoeira para o toque de samba de roda; não demorou e já era marrabenta!

Salve a diversidade e a mescla cultural! "_Salve!"
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PS: a foto desta postagem é da Mcel, pois no texto "Ishh, Yôwê!" eu já postei um vídeo da Vodacom! hehe

(1) Expressão do Hino Nacional de Moçambique que se refere às extremidades do país. É como se fosse “de norte a sul” ou, para os brasileiros, “do Oiapoque ao Chuí”.
(2) As mulheres que trabalham na rua são em menor número, e vendem grãos, legumes e frutas.
(3) A projeção para 10 anos era de 6.500 usuários, porém atingiu um milhão 6 anos após a implantação.

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8 comentários:

Anônimo disse...

Querida, fiquei imaginando voce aí, fazendo as pesquisas, vivenciando Moçambique, compartilhando e me ocorreu agora: seria uma excelente jornalista também, e cá entre nós, acho que está com sua dissertação quase pronta.
beijos cigana do meu coração,
Ci

Anônimo disse...

Oi Jana! Esqueceu de dizer que também é possível acessar a internet através de celular PRÉ-PAGO, sem ser tecnologia 3G. Quando estava fazendo pesquisa no mato (onde às vezes não havia nem rede de energia elétrica), eu acessava a internet conectando o celular ao notebook. A velocidade era bem razoável e a conexão super estável. As tarifas de acesso e uso são essas mesmas irrisórias que você descreve. Enfim, a mCel e a Vodacom bem que poderiam vir ao Brasil ensinar o que é democratização do acesso à telefonia...
Saudades de vocês!!!
Beijos,
Henrique.

Janaína Leslão disse...

Ci, minha flor! Guento outra faculdade não! rsrs Mas passar a vida viajando e contando os "causos" não é má idéia! hehehe

Henrique, querido!! Sabe que essa vivência "no mato" eu não tive! Obrigada pela contribuição!! Imagine poder contar com essa tecnologia lá onde nem energia elétrica tem!! Vamos fazer uma campanha pra Mcel ir pro Brasil! hehe

Beijo nos dois!

Rose Sztibe disse...

Gostei da "materia". Embora com todos os nossos problemas e restrições tecnológicas e financeiras, aqui a telefonia celular também permitiu acesso para muitos, principalmente para os trabalhadores autônomos, pedreiros, eletrecistas, encanadores, ou para pessoas morando nos cafundós da zona leste, ou da zona sul. Mas, nada comparado ao que você descreveu. E estou falando de São Paulo. Coisa muito diversa foi e continua sendo no resto do país. Que beleza! No meio de tantas carências dessas Áfricas, pelo menos isso.
E, aproveitando a deixa, o que a senhora está fazendo por ai?
beijins.

Anônimo disse...

Janaína, seu pai aquentou três graduações, três especializações e hoje faz PDE(Mestrado), e por que você na forçar da idade, não pode mais uma, duas...
Beijos, te amo.
Chico Guerrero

Janaína Leslão disse...

Rose,
já pensou se pudessemos falar com o Brasil por preço de ligação local, não pagar deslocamento ou enviar um sms por menos de 0,02 reais? rsrs
Realmente isso do celular em SP também é um fenomeno!Uma maravilha para os trabalhadores autonomos e pra população em geral quando quer contacta-los! Uma tarifa mais baixa é possivel e beneficiaria mais gente! hehe
Beijos!

Janaína Leslão disse...

Papis, meu lindo...
obrigada pelo comentário! Tô tão, tão, tão feliz com sua participação!!
Até esse momento nem sabia que lia meu bloguinho!! Realmente fiquei emocionada!
Beijos transoceanicos! Também te amo!
PS: pensa que é facil ter um pai com um currículo desses? rsrs Isso porque vc ainda não contou que fez tudo isso depois de casar, e que antes era alfaiate! Eita orgulho que tenho de sua história!!

Isadora disse...

mCel e Vodacom no Brasil, agora! não tem alguma empresa de internet que preste aí também? precisamos fazer campanha!!!!!
beijos!!!